Belarus: conversa com Volha Franco
Professora de russo e apaixonada pelas obras de Jorge Amado, Volha Franco vive em Salvador, Bahia, e respondeu algumas perguntas sobre Belarus e a situação atual. Ela fala sobre o interesse pelo Brasil, a vida em uma ditadura, pandemia e fraudes em seu país. Na live do Facebook existem ainda mais detalhes.
Como
surgiu seu interesse pelo Brasil e quando se mudou para o país?
Não havia motivação específica de vir ao
Brasil. Eu estava estudando português por aprender alguma língua que não fosse
muito difícil ou exótica. Quando tinha um nível intermediário comecei a ler
Jorge Amado e através dos livros dele me apaixonei por Salvador, principalmente
o Mar Morto, o livro que fez minha cabeça para eu ter que vir ao Brasil e ter
contato com Iemanjá. Foi assim que cheguei em Salvador.
Durante a infância como foi viver em uma ditadura e quando se deu conta da situação de Belarus?
Sobre a ditadura você vive nela e a percebe como normal, como algo natural. Então na infância não se dava muita conta disso e quando Lukashenko chegou ao poder eu tinha 5 anos. Estava na primeira série e não me lembro do período antes dele, mas lembro quando ele mudou a bandeira.
Em 95 adicionou russo como língua oficial, mas isso não impactou tanto porque na prática a maioria das pessoas da minha cidade já falavam o idioma. A minha cidade é Navapolack, que foi formada em volta de umas fábricas de refinaria de petróleo e as pessoas da União soviética chegavam na cidade para construí-la e trabalhar nas refinarias. Era uma cidade muito russófana, muito mais que outras cidades de Belarus. De um modo geral Belarus se encontra muito russificada.
Na escola eu entendia e a gente falava meio que brincando, meio que sério, que Lukashenko usurpava o poder, que estava virando uma ditadura. Em 2004 eu já estava terminando a escola e ele iniciou um referendo que para poder ficar mais de dois mandatos seguidos no poder. Alterou a constituição, isso eu lembro bem.
Em 2004 quando ele realmente mexeu na constituição e tirou a restrições de 2 mandatos seguidos eu terminava a escola e começava a carreira em jornalismo. Eu comecei mandando alguns artigos e redações no jornal local e independente, que eram resistentes a ele.
De 2004 para cá pirou muito a situação porque ele tem um exército de jornalistas do governo, que seriam propagandistas na prática. Isso não tem nada a ver com jornalismo. Tem mídias independentes que estão lutando e sobrevivendo contra a pressão do governo, que tenta censurar tudo. Essa parte eu lembro bem.
Após escola entrei na faculdade de jornalismo e depois de 2 anos fui expulsa por trabalhar na mídia independente. Falaram-me que se estudo na faculdade pública não posso trabalhar para mídia independente e isso deveria ser óbvio. Para mim na época não era óbvio e eu estava resistindo.
Belarus
foi citada no Brasil, porém mais em mídias alternativas, porque Aleksandr
Lukashenko recomendou beber vodka, trabalhar no campo e ir à sauna pra combater
o coronavirus. Qual a situação da pandemia e dos hospitais no país? As pessoas
acreditam nessas mediadas citadas por ele?
Não é que ele ofereceu isso como medida séria, ele falava mais na zoeira. Não sei o que acontecei, mas acho que o quadro psicológico dele piorou muito esse ano porque ele fala muita bobagem e não é tanto isso que revoltou a população.
Belarus foi o único país da Europa e um dos poucos no mundo que não declarou pandemia. Não teve distanciamento social oficializado, nada disso. Ele falava que isso tudo era bobagem e não pode parar a economia e essas coisas todas. Mas pior do que isso não é a zoeira de beber vodka, mas quando começaram a divulgar as primeiras mortes do coronavirus, primeiro que as pessoas estavam indignadas porque eles estavam escondendo essas informações.
Ou seja, eles fraudam eleições e estavam omitindo, escondendo e falsificando os dados sobre as pessoas contaminadas e falecidas por causa do covid. Estão as pessoas começaram a se preocupar com a própria saúde e viram que o ditador não garante nem esse direito básico de saúde, não da esse tipo de segurança e ele estava zuando as pessoas que morriam. Ele falava “Aquele cara era um velhaco, o que ele queira? Tinha 80 anos. Porque foi sair para as ruas?”.
Mas antes disso ele falava que as pessoas tinham que trabalhar, que a economia não devia parar. Depois falava que velhos não deviam trabalhar, deviam parar. Enfim, sempre culpava as pessoas dizendo que se morreram foi porque elas quiseram. Algo muito feio e de desrespeito com o povo. Acho que isso que revoltou mais e por isso que mudou, porque fraudes e falsificações são coisas que ocorrem sempre. Não era novidade.
Pode ser novidade, talvez, para gente jovem que nasceu nos anos 2000/2004, ou seja, quando eu já era uma revolucionária. Talvez para essas pessoas isso seja novidade, mas para muita gente não é novidade e na situação atual o povo não sabe mais o que é esperar e tem o risco de morrer de covid antes da ditadura acabar. O povo assumiu não ter mais nada a perder.
Sobre a ditadura você vive nela e a percebe como normal, como algo natural. Então na infância não se dava muita conta disso e quando Lukashenko chegou ao poder eu tinha 5 anos. Estava na primeira série e não me lembro do período antes dele, mas lembro quando ele mudou a bandeira.
Em 95 adicionou russo como língua oficial, mas isso não impactou tanto porque na prática a maioria das pessoas da minha cidade já falavam o idioma. A minha cidade é Navapolack, que foi formada em volta de umas fábricas de refinaria de petróleo e as pessoas da União soviética chegavam na cidade para construí-la e trabalhar nas refinarias. Era uma cidade muito russófana, muito mais que outras cidades de Belarus. De um modo geral Belarus se encontra muito russificada.
Na escola eu entendia e a gente falava meio que brincando, meio que sério, que Lukashenko usurpava o poder, que estava virando uma ditadura. Em 2004 eu já estava terminando a escola e ele iniciou um referendo que para poder ficar mais de dois mandatos seguidos no poder. Alterou a constituição, isso eu lembro bem.
Em 2004 quando ele realmente mexeu na constituição e tirou a restrições de 2 mandatos seguidos eu terminava a escola e começava a carreira em jornalismo. Eu comecei mandando alguns artigos e redações no jornal local e independente, que eram resistentes a ele.
De 2004 para cá pirou muito a situação porque ele tem um exército de jornalistas do governo, que seriam propagandistas na prática. Isso não tem nada a ver com jornalismo. Tem mídias independentes que estão lutando e sobrevivendo contra a pressão do governo, que tenta censurar tudo. Essa parte eu lembro bem.
Após escola entrei na faculdade de jornalismo e depois de 2 anos fui expulsa por trabalhar na mídia independente. Falaram-me que se estudo na faculdade pública não posso trabalhar para mídia independente e isso deveria ser óbvio. Para mim na época não era óbvio e eu estava resistindo.
Não é que ele ofereceu isso como medida séria, ele falava mais na zoeira. Não sei o que acontecei, mas acho que o quadro psicológico dele piorou muito esse ano porque ele fala muita bobagem e não é tanto isso que revoltou a população.
Belarus foi o único país da Europa e um dos poucos no mundo que não declarou pandemia. Não teve distanciamento social oficializado, nada disso. Ele falava que isso tudo era bobagem e não pode parar a economia e essas coisas todas. Mas pior do que isso não é a zoeira de beber vodka, mas quando começaram a divulgar as primeiras mortes do coronavirus, primeiro que as pessoas estavam indignadas porque eles estavam escondendo essas informações.
Ou seja, eles fraudam eleições e estavam omitindo, escondendo e falsificando os dados sobre as pessoas contaminadas e falecidas por causa do covid. Estão as pessoas começaram a se preocupar com a própria saúde e viram que o ditador não garante nem esse direito básico de saúde, não da esse tipo de segurança e ele estava zuando as pessoas que morriam. Ele falava “Aquele cara era um velhaco, o que ele queira? Tinha 80 anos. Porque foi sair para as ruas?”.
Mas antes disso ele falava que as pessoas tinham que trabalhar, que a economia não devia parar. Depois falava que velhos não deviam trabalhar, deviam parar. Enfim, sempre culpava as pessoas dizendo que se morreram foi porque elas quiseram. Algo muito feio e de desrespeito com o povo. Acho que isso que revoltou mais e por isso que mudou, porque fraudes e falsificações são coisas que ocorrem sempre. Não era novidade.
Pode ser novidade, talvez, para gente jovem que nasceu nos anos 2000/2004, ou seja, quando eu já era uma revolucionária. Talvez para essas pessoas isso seja novidade, mas para muita gente não é novidade e na situação atual o povo não sabe mais o que é esperar e tem o risco de morrer de covid antes da ditadura acabar. O povo assumiu não ter mais nada a perder.
A União Europeia e os E.U.A. não tem tanto poder sobre Belarus e as pessoas que estão preocupadas com o imperialismo dos E.U.A. sabem que não tem como chegar e ficar controlando o país, mas eles também não se metem tanto para não comprarem briga com a Rússia e entrarem em conflito A Rússia tem influência econômica.
Eles dão esse apoio verbal que não apoiam a ditadura e apoiam os manifestantes, mas não vão intervir.
Eles vão inserir sansões contra políticos e pessoas que apoiam o ditador, mas é nada muito sério.
O que o povo está exigindo é a renuncia
imediata de Lukashenko, soltar todos os prisioneiros políticos e também fazer
novas eleições transparentes. Acho que não é possível mantendo Lukashenko no
poder, mesmo temporariamente, não seria
possível fazer eleições transparentes. É necessário ter a renuncia dele e novas
eleições.
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